Ou quando dois extraterrestres roubaram o braço de um cara na Rua Barata Ribeiro

O ufólogo Jonas Fritz assustou-se com a campainha do apartamento sendo pressionada de maneira insistente. Quem seria? O interfone não tocou antes, o telefone também não e ninguém combinou de fazer visita. Olha então através do olho mágico e, espantado, se depara com dois camaradas magros, brancos, altos e calvos vestindo ternos pretos; alinhamento federal.

– Que diabo é isso aí? – pensou. Andava de um lado para outro e a campainha continuava tocando. Uma hora decidiu abrir em rompante:

– POIS NÃO, SENHORES! – De tão nervoso soltou um ‘quase berro’, erguendo o nariz.

Um dos caras apenas entregou aquele pequeno envelope azul, selado por uma estrela dourada. Logo depois os dois partiram sem dizer nada, palavra alguma. Expressão vazia. Robóticos.

– Mas que droga é essa? Alienígenas…? Será…?! Estranho… Só podem ser alienígenas.

Abriu o envelope, e dentro dele havia única e fria mensagem: “Não escreva mais sobre nós”.

– O QUÊ?? UMA PORRA QUE NÃO, SEUS ALIENÍGENAS CANALHAS! NÃO ESCREVO É?? POIS VEREMOS! A MATRIX NÃO VAI PEGAR ESTE CACHORRÃO AQUI, CAVALHEIROS. NÃO MESMO!

Sentou de frente ao computador e soltou cinquenta páginas tortas de pura indignação contra os alienígenas, os mesmos biltres que o abduziram naquele maldito cafezal em Minas Gerais. Esses eram os grandes pilantras, os humanos “evoluídos” de Gliese 581 que atuam na Terra ao lado de russos e americanos, e agora dos chineses também.

Fritz ainda perguntou ao porteiro do edifício se ele não viu uns caras engravatados subindo mais cedo, porém o porteiro insistiu que a porta só fora aberta três vezes naquela manhã, e sempre por moradores que saíam.

– Posso ver a câmera de segurança?

– Pode, ué!

Nada… Antes tivesse aparecido algum magricelo passando de fininho na imagem, esgueirando, sorrateiro… Nada.

– Muito obrigado, Lourival.

– Disponha, Doutor.

Lá pelas onze da noite, Fritz publicou o texto “Os alienígenas malignos” no seu site e depois foi dormir. Em sonho, se viu deitado numa mesa cirúrgica, com vários magricelos de jaleco branco, todos iguais, ao seu lado; observavam-no, curiosos, e ao mesmo tempo, arrancavam pedaços de seu corpo com uma espécie de cortador iluminado. Acordou berrando às seis da manhã. Mas a surpresa maior ainda estava por vir: seu braço direito estranhamente já não existia no corpo. Não havia sangue, nem sinais de corte, apenas o ombro solitário, como se desde o nascimento sempre estivesse assim.

-AHHHHHHHHHH CARALHO!! MEU BRAÇO! O QUE ACONT…?? MAS O QUÊ?? AHHHHHHHHHHRRRGHT!!

Desceu as escadas correndo e mostrou o braço direito ao porteiro, ou melhor, relatou sobre a misteriosa falta dele.

– Doutor, pelo amor de Deus se acalme, o senhor nunca teve esse braço aí não!

– COMO NÃO?? EU SEMPRE APERTEI SUA MÃO COM A DIREITA!! DROGA, LOURIVAL, EU SOU DESTRO; OS ALIENÍGENAS ROUBARAM O MEU BRAÇO DE ESCREVER!!

– Olhe, Doutor, tente se acalmar. Eu tenho um primo que é assim também, às vezes acorda esquecido, com a cabeça meio tumultuada, nervoso… e é normal, viu? Deve ser falta de descanso ou de vitaminas.

– TÁ LEGAL, puta que pariu setenta vezes, tá legal, tá legal, tá legal, tá legal… OH MEU DEUS! – O cara tentava se acalmar, mas sempre que via o ombro solitário soltava dois palavrões ou chamava ajuda celestial, parecia mesmo protagonizar um filme de terror, basicamente estava equilibrando aquilo tudo por um sofrido fiapo de sanidade.

Correu em busca do velho álbum de fotos para ver o seu braço direito, e lá estava ele… Sem o maldito braço direito! Desde o berço, apenas o bracinho esquerdo pendurado e o ombro direito sozinho. Berrou assustado, desmaiando sobre as fotos.

Ao acordar, com baba pelo rosto colado sobre o álbum de fotos, cara inchada de quem chorou um rio, percebeu que os dois braços estavam no lugar, e as fotos, exatamente como eram antes. Sobre a mesa da sala outro bilhete: “Você vai escrever apenas o que for autorizado por nós. Tudo bem?”

– Sim, sim, mil vezes, sim!!! Obrigado, cavalheiros, muitíssimo obrigado!! Eu nem quero mais escrever as verdades do mundo, só quero ter dois braços numa jaqueta e uma mulher que me ame.

Atualmente, Fritz segue escrevendo ficção científica, romance, e fantasia. Mas, ainda assim, seus originais são enviados primeiro para Gliese 581, onde são melhores adaptados para o frágil público terrestre, dentro dos anseios e interesses da grande cúpula maligna extraterrestre.

*Publicado originalmente em 13 de setembro de 2013